Por Larissa Garcia Salgado *
Decisão não é pela volta da contribuição sindical obrigatória ou imposto sindical
Recentemente o Superior Tribunal Federal (STF) declarou a constitucionalidade da cobrança da contribuição assistencial de trabalhadores não sindicalizados. O tema, não só pelo impacto no salário dos trabalhadores, mas especialmente porque reflete uma absoluta mudança de posicionamento do Supremo, traz reflexões importantes.
A decisão, de setembro de 2023, traz uma alteração no entendimento acerca da legalidade sobre as cobranças das contribuições assistenciais, determinando alteração nas negociações coletivas, bem como no modus operandi das empresas. A taxa passou a ser compulsória, ou seja, havendo previsão em norma coletiva, em princípio, haverá o desconto. O trabalhador que não quiser ter esse desconto em sua folha salarial, precisa manifestar oposição expressa. Até então, o cenário era o oposto, para que houvesse o desconto o trabalhador deveria anuir expressamente ao desconto.
Por tratar-se de tema sensível, que impacta na remuneração dos trabalhadores, há efetivamente muita insegurança jurídica e questionamentos por parte das empresas e empregados. Grande parte da insegurança se deve à utilização incorreta de alguns termos, que, apesar de semelhantes, implicam em conceitos distintos.
Por isso, antes de tudo, é extremamente importante pontuar que a decisão não é pela volta da contribuição sindical obrigatória ou imposto sindical. O imposto sindical era uma taxa obrigatória, prevista em lei, que obrigava o repasse ao sindicato de um dia de salário de todos os trabalhadores com carteira assinada no país. O imposto Sindical foi extinto pela Lei nº 13.467/2017 – Reforma Trabalhista – passando a inexistir obrigatoriedade do desconto e repasse aos Sindicatos destes valores, condicionando o seu desconto à autorização prévia e expressa do trabalhador. Considerando que a extinção da contribuição Sindical decorreu de imposição legal, eventual alteração da revogação da obrigatoriedade da contribuição sindical deverá ser realizada pelo Congresso Nacional.
Já a contribuição assistencial, ora declarada constitucional pelo Supremo, é uma parcela prevista em acordo ou convenção coletiva de trabalho, aprovada em Assembleia, imposta a todos os trabalhadores da categoria profissional beneficiada pela norma coletiva que a prevê. Segundo novo entendimento do STF, é constitucional a cobrança desta contribuição prevista na norma coletiva, de todos os empregados da categoria, mesmo que não sindicalizados, desde que previsto o direito à oposição, ou seja, desde que a norma preveja expressamente o direito do empregado se opor ao desconto.
Delimitados os conceitos de ambas as contribuições, é importante compreender a abrangência e efeitos da decisão do STF. Ambas as contribuições, bem como a mensalidade ou contribuição associativa – feita pelo empregado que se associado –, historicamente possuem o objetivo de custear o trabalho dos sindicatos, sendo efetivamente as fontes de custeio dos Sindicatos.
Antes da Reforma Trabalhista, ou seja, enquanto ainda vigente a cobrança da contribuição sindical obrigatória, se formava no Supremo o entendimento de que a contribuição assistencial, aquela prevista na norma coletiva, somente poderia ser cobrada dos empregados sindicalizados, sendo inconstitucional a cobrança dos não associados. Segundo esse entendimento, a imposição do pagamento aos não associados, além de ferir o princípio da liberdade de associação ao sindicato, violaria também o sistema de proteção ao salário do trabalhador (arts. 7º, VI, da CF e 462 da CLT).
Neste sentido, para que o empregado não associado pudesse sofrer o desconto, deveria anuir expressamente.
A recente decisão do Supremo altera completamente o cenário, a nova decisão prevê que é constitucional a cobrança da contribuição assistencial dos não associados, não havendo necessidade de anuência expressa prévia, apenas sendo garantido o direito à oposição.
Uma das justificativas para essa alteração de entendimento é a Reforma Trabalhista. Isto porque, a mudança legislativa operada em 2017, alterou, entre outros, o artigo 578 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para extinguir a contribuição sindical obrigatória (ou “imposto sindical”).
Nesse novo cenário, os Ministros passaram a entender que é constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletiva, da chamada contribuição assistencial, pois é uma forma de remunerar os sindicatos pelas negociações coletivas, bem como atender aos termos da Reforma que prevê o “negociado sobre o legislado”. Segundo o novo entendimento do Supremo, a Reforma Trabalhista empodera os Sindicatos, havendo necessidade de privilegiar a negociação coletiva e, para tanto, é necessário o financiamento adequado dos Entes Sindicais.
A tese de repercussão geral fixada no Tema 935 foi a seguinte: “É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição”.
A mudança de entendimento do Supremo trouxe uma série de desafios e insegurança jurídica, pois muitas dúvidas existem sobre a possibilidade de cobrança relacionada às normas coletivas em vigor, bem como sobre os limites destas cobranças pelos Sindicatos.
A cobrança retroativa é um temor dos trabalhadores. Embora as Centrais Sindicais tenham recomendado pela não cobrança retroativa, algumas Entidades tentam viabilizar a cobrança referente ao passado, gerando absoluta insegurança das empresas em proceder os descontos e receio dos empregados em ter os seus salários violados, sem ciência prévia.
Isto porque, em muitas normas coletivas, o prazo para a oposição já venceu e os empregadores não a fizeram, pois não havia a necessidade.
Pelas inseguranças acima, nos parece absolutamente salutar os embargos de declaração opostos pela Procuradoria Geral da República com o objetivo de esclarecer pontos da decisão, mas, especialmente, modular os efeitos da decisão, na medida em que houve substancial alteração no entendimento até então vigente, prevenindo cobranças retroativas em detrimento dos trabalhadores; esclarecer a observação da razoabilidade quando da instituição do valor da contribuição assistencial, bem como o esclarecimento sobre a impossibilidade de que ações de terceiros interfiram no livre exercício do direito de oposição dos trabalhadores.
Os esclarecimentos acima se fazem absolutamente necessários para trazer maior segurança jurídica aos empregados e empregadores, havendo necessidade também de conscientização e esclarecimento de todas as partes envolvidas, o que se espera seja alcançado com esse novo julgamento.
Até o julgamento dos embargos, que se espera resolva as maiores controvérsias sobre a aplicação do novo entendimento do Supremo, trabalhadores e empresas seguem com muitas dúvidas havendo necessidade precípua de razoabilidade das partes frente a alteração de entendimento.
* Larissa Garcia Salgado, advogada na área Trabalhista no Silveiro Advogados
Fonte: Jota
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