Subnotificada, violência patrimonial é mais comum entre mulheres e ocorre de forma sutil
Por Gustavo Boldrini, do Broadcast
Um dos tipos de violência contra a mulher mais comuns, mas também subnotificado, é a patrimonial. Trata-se de uma forma de agressão mais sutil, que muitas vezes foge ao senso comum. Lembra do caso da atriz Larissa Manoela? Há quem veja como disputa familiar sobre bens, mas vai um pouco além. Por isso, é importante identificar o que configura esse tipo de violência.
A violência patrimonial está tipificada na Lei Maria da Penha. Ela está no parágrafo IV do artigo 7º da legislação, e é “entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades”.
Ou seja: a violência patrimonial é uma forma de impedir que a mulher tenha acesso a bens materiais ou financeiros, geralmente pelo seu cônjuge ou companheiro. Mas nada impede que esse tipo de prática ocorra em outras relações, como entre pais e filhos e com idosos.
“O termo tem sido utilizado para descrever restrições patrimoniais cometidas em contexto de relação de afeto ou de alguma forma de dependência, como relacionamentos, parcerias domésticas, relações familiares e aquelas entre cuidadores e idosos ou pessoas com deficiência. Assim, a vítima de violência patrimonial não necessariamente será uma mulher, mas é necessário que esteja em situação de vulnerabilidade em relação ao agressor”, explica Ana Colombo, advogada da área de Direito Penal do Silveiro Advogados.
Segundo Rodrigo da Cunha Pereira, advogado especializado em Direito de Família e Sucessões e Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), “a violência patrimonial pode ocorrer em qualquer relação”, e a “busca por direitos decorrentes de uma violência patrimonial não é específica da Lei Maria da Penha, mas do Direito Penal e Cível em geral”, envolvendo crimes patrimoniais, como roubo, furto, apropriação indébita de bens, etc.
O fato de a violência patrimonial estar geralmente ligada a um contexto de gênero, segundo Pereira, diz respeito à estrutura da sociedade. A ideia desse tema ser tratado na Lei Maria da Penha, segundo ele, serve “para proteger a parte histórica e economicamente mais frágil”, que nasce “do machismo decorrente do sistema patriarcal, em que a suposta superioridade masculina é quem tem o domínio de tudo, inclusive do patrimônio”.
Apenas três em cada dez mulheres vítimas de violência denunciaram a última agressão sofrida em uma delegacia comum, segundo dados da pesquisa Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, do Senado Federal em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência (OMV). O levantamento mostra ainda que 30% de todas as mulheres entrevistadas já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar provocada por um homem.
Como identificar casos de violência patrimonial?
“A violência patrimonial não foge à regra das demais formas de violência contra a mulher”, explica a advogada Ana Colombo. Sendo assim, ela pode começar de forma sutil, quase imperceptível, e ir aumentando a gravidade ao longo do tempo.
“Os atos, muitas vezes, são travestidos de uma forma de carinho e de cuidado do agressor, que convence a vítima de que ele proverá todas as suas necessidades, sendo dispensável que ela tenha renda própria ou controle sobre seu patrimônio”, diz Colombo.
Segundo a especialista, alguns sinais de alerta para a violência patrimonial podem ser impedir acesso à conta bancária, violar cartões de crédito, exigir a transferência de valores sem contrapartida ou justificativa ou impedir o acesso ao dinheiro em razão de uma briga.
Quais são as penas previstas em lei para casos de violência patrimonial?
Como observado pelos especialistas, violência patrimonial em si não é um crime tipificado em lei, mas há a possibilidade de aplicar penas referentes aos crimes patrimoniais que possam ser cometidos dentro do contexto da violência patrimonial. Mas, como destaca a advogada Ana Colombo, o tema é complexo.
“O Código Penal prevê a isenção de pena para aqueles crimes patrimoniais sem violência ou grave ameaça cometidos em prejuízo de cônjuge na constância do casamento ou contra ascendentes (pais e avós) ou descendentes (filhos)”, explica. Isso, segundo ela, cria uma situação de divergência: “Enquanto a Lei Maria da Penha prevê a restrição patrimonial como forma de violência, o Código Penal vai em sentido contrário, isentando de pena aquele que, por exemplo, se apropria indevidamente do patrimônio exclusivo do cônjuge.”
Apesar disso, a Lei Maria da Penha pode ajudar mulheres vítimas de violência patrimonial a buscarem medidas protetivas de urgência, “como a determinação de restituição de bens indevidamente subtraídos, a proibição temporária de celebração de contratos que envolvam bens comuns do casal, entre outros”.
Como denunciar casos de violência patrimonial?
A violência patrimonial, bem como qualquer caso de violência doméstica contra a mulher, pode ser alvo de denúncia em delegacias especializadas em atendimento à mulher, seja presencialmente, seja por telefone, pelo número 180. Também é possível buscar a Defensoria Pública, o Ministério Público ou advogadas e advogados alinhados a essa causa.
Para uma denúncia mais efetiva, recomenda-se que a mulher junte provas da violência sofrida, como comprovantes de transações financeiras, prints de conversas em aplicativos de mensagens e relatos de testemunhas que corroboram as denúncias.
Fonte: InvesTalk
Comentários