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O combate ao Coronavírus (COVID-19) trouxe inegáveis desafios ao setor empresarial. As necessárias medidas de distanciamento social demandam soluções remotas eficazes junto a fornecedores, parceiros, colaboradores e investidores, sem que haja prejuízo à segurança jurídica dos atos empresariais.Uma das soluções que vem sendo objeto de consulta recorrente é a assinatura eletrônica de contratos.


1. Há validade jurídica nos documentos assinados eletronicamente?

A Medida Provisória 2.200/01, que Instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICPBrasil, garante a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil, os quais presumem-se verdadeiros em relação aos signatários. O tema foi posteriormente objeto da Lei nº 12.682/12, que dispôs sobre a elaboração e o arquivamento de documentos em meios eletromagnéticos, requerendo que o processo de digitalização seja realizado com o emprego de certificado digital. Mais recentemente, a Lei nº 13.874/19, popularizada como Lei da Liberdade Econômica, dispensou inclusive a exigência de guarda do documento físico original, assegurando que o documento digital e a sua reprodução, em qualquer meio, realizada de acordo com o disposto nessa lei, terão o mesmo valor probatório do documento original.

2. É necessária a assinatura de duas testemunhas para tornar o contrato executável em juízo?

O Código de Processo Civil lista um rol taxativo de títulos executivos extrajudiciais, incluindo o “documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas”. Entretanto, ao julgar o REsp n.º 1.495.920/DF[1], o STJ estendeu a possibilidade de ser considerado título executivo extrajudicial ao contrato assinado de forma eletrônica apenas pelas partes, retirando, portanto, a necessidade de assinatura de duas testemunhas. Uma vez que a assinatura eletrônica agrega aos contratos autenticidade e integridade, seria desnecessária a assinatura das testemunhas. Cabe destacar que esse precedente não se trata de recurso repetitivo e, portanto, não vincula o posicionamento dos tribunais em outros casos envolvendo o mesmo tema. Entretanto, a posição adotada pelo STJ, destacada acima, parece-nos compatível com o atual ambiente de negócios, especialmente no contexto das limitações de deslocamento trazidas pela pandemia de COVID-19. De qualquer modo, é importante referir que a adoção dessa modalidade de contrato e de assinatura não é adequada para negócios jurídicos que demandem formalidade específica, como é o caso da escritura pública. Havendo interesse na adoção de contratos eletrônico, recomendamos seja utilizada empresa certificadora devidamente reconhecida no mercado e habilitada pela ICP-Brasil, bem como sejam incluídas disposições expressas no documento sobre a forma de assinatura adotada e o seu reconhecimento, pelas partes, como medida plenamente válida e eficaz de manifestação de vontade.


1] Ementa: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. EXECUTIVIDADE DE CONTRATO ELETRÔNICO DE MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE (CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA. TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. POSSIBILIDADE, EM FACE DAS PECULIARIDADES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE SER EXCEPCIONADO O DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73 (ART. 784, INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS DE OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS, RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO ELETRÔNICO. PRECEDENTES.

1. Controvérsia acerca da condição de título executivo extrajudicial de contrato eletrônico de mútuo celebrado sem a assinatura de duas testemunhas.

2. O rol de títulos executivos extrajudiciais, previsto na legislação federal em “numerus clausus”, deve ser interpretado restritivamente, em conformidade com a orientação tranquila da jurisprudência desta Corte Superior.

3. Possibilidade, no entanto, de excepcional reconhecimento da executividade de determinados títulos (contratos eletrônicos) quando atendidos especiais requisitos, em face da nova realidade comercial com o intenso intercâmbio de bens e serviços em sede virtual.

4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil, inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade negocial vigente e, especialmente, à revolução tecnológica que tem sido vivida no que toca aos modernos meios de celebração de negócios, que deixaram de se servir unicamente do papel, passando a se consubstanciar em meio eletrônico.

5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados.

6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos.

7. Caso concreto em que o executado sequer fora citado para responder a execução, oportunidade em que poderá suscitar a defesa que entenda pertinente, inclusive acerca da regularidade formal do documento eletrônico, seja em exceção de pré-executividade, seja em sede de embargos à execução. 8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.”