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Em um cenário marcado pela escassez de capital para startups em estágios iniciais e uma taxa Selic ainda elevada[1], o South Summit Brazil 2025 reuniu mais de 23 mil pessoas no Cais Mauá, em Porto Alegre (RS), durante o mês de abril. O South Summit Brazil se consolidou como um dos principais eventos de inovação, empreendedorismo e tecnologia da América Latina, reunindo startups, investidores, corporações e agentes públicos em discussões sobre o futuro dos negócios.

Entre painéis sobre inteligência artificial — com mais de 40 sessões dedicadas ao tema — e debates sobre a reconstrução do Rio Grande do Sul após as enchentes de 2024, um tema despontou de forma sutil, mas relevante: a governança corporativa em startups.

Governança como propulsora das startups

Embora não tenha sido o foco principal do evento, a governança apareceu como pauta estratégica em diversos momentos, em especial no painel Stages and Implementation of Governance in Startups, que buscou desconstruir a percepção de que governança e inovação são forças opostas.

O painel destacou que a adoção de práticas de governança não apenas é compatível com a lógica ágil das startups, como pode ser uma alavanca importante para o crescimento sustentável e atração de investimentos para as startups. A primeira lição foi clara: os maiores riscos à sobrevivência de uma startup muitas vezes nascem dentro de casa, entre os próprios sócios.

Questões como expectativa de dedicação, pró-labore, férias e tomada de decisões estratégicas podem gerar ruídos ou até rupturas entre fundadores. Investidores atentos detectam rapidamente esses desalinhamentos, o que pode comprometer negociações, por mais promissor que seja o produto[2].

Tais conceitos e alinhamentos, desde a fase de ideação, já trazem maturidade à futura organização, além de tranquilidade aos sócios, para que estes possam focar no que realmente importa: o produto.

Acordos e alinhamentos: o que os investidores querem ver?

Há um leque de ferramentas disponíveis para mitigar esses riscos: desde trocas informais por mensagens até memorandos entre sócios fundadores e acordos societários mais robustos.

Mais do que o formato, importa o conteúdo: clareza sobre papéis, metas e valores compartilhados. A troca de experiências com outros fundadores e com investidores também pode ser essencial para preparar as startups para as fases seguintes de captação.

Com o crescimento das startups, saindo de uma fase de ideação, e passando à validação, cresce a necessidade de regular direitos. Sejam direitos de propriedade intelectual, formato de regime para a entrada de primeiros colaboradores, ou ainda uma evolução das já alinhadas funções de cada fundador.

O mesmo ocorre na tração e na escala. Com receitas em crescimento e uma maior necessidade de investimentos, processos internos passam a ser inegociáveis, e investidores passam a deter uma posição na mesa de tomada de decisões.

Isto é, não há um playbookaplicável a todas as etapas e todos os tipos de startups. Entretanto, não há como se negar que, na etapa em que se estiver, haverá formas de maior proteção aos fundadores e maior atração de investidores, através da governança.

Governança como estratégia desde o início

Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, em publicação sobre o tema[3]:

“A governança corporativa assenta-se em quatro princípios básicos: transparência, equidade, prestação de contas (accountability) e responsabilidade corporativa. Esses princípios devem ser observados desde o surgimento da startup, mesmo que ela vá desenvolvendo a sua governança paulatinamente. A taxa de mortalidade das startups é alta, mas o risco de insucesso pode ser reduzido por meio da adoção de boas práticas de governança.”

Nesse sentido, outro ponto abordado no painel referido foi o uso da governança como expressão estratégica.

Em muitos casos, mesmo startups em fase inicial têm incorporado ao contrato social cláusulas voltadas à sustentabilidade, transparência e impacto social — práticas ainda embrionárias, mas que sinalizam um posicionamento para o futuro.

Da mesma forma, mesmo que sem formalizações, outras já realizam práticas de governança, com o estabelecimento de rotinas e processos para a tomada de decisões.

Mulheres investidoras e o papel da governança

O painel Women Who Exit, por exemplo, trouxe à tona experiências de fundadoras e gestoras de fundos que, ao avaliar startups, valorizam desde o início elementos como diversidade, responsabilidade social e estruturação clara das decisões.

Tais elementos podem ser vislumbrados desde o pitch, mas ganham maior relevância se já demonstrados no plano de negócios e eventualmente – a depender do estágio da startup – até já aplicados na prática.

Na fala das palestrantes, se mencionaram casos em que o plano de negócios, desde o dia 1, já estabelecia inclusive as formas de saída dos sócios. Isto é, qual o passo-a-passo do negócio para se chegar em um cenário de venda da empresa, e como a empresa se prepararia para tanto.

Para essas líderes, a governança não é só uma questão técnica — é parte do DNA do negócio.

✅ Conclusão

Em um cenário de incertezas macroeconômicas, e de dificuldade de acesso de capital, a estruturação de critérios mínimos de governança podem, portanto, ser, no mínimo, um diferencial competitivo, e, por vezes, fato condutor da decisão de investimento.

O South Summit Brazil 2025 revelou que, mesmo em meio à escassez de capital e à urgência por inovação, há uma agenda sutil, porém decisiva, ganhando espaço: a da maturidade das startups. E essa maturidade começa — invariavelmente — pela governança.

Referências

[1] https://startups.com.br/pesquisas/em-ritmo-de-cautela-startups-latinas-captam-us-1-15-bi-no-q1/

[2] https://startups.com.br/artigo/governanca-corporativa-deve-ser-um-assunto-para-sua-startup/

[3] Governança corporativa para startups & scale-ups / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. São Paulo, SP: IBGC, 2019. (Série IBGC Segmentos). 56 p.

Bia Kowalewski e Julie Kelbert Griebler, sócias da área de Societário, Fusões e Aquisições. Contato: bia.kowalewski@silveiro.com.br e julie.griebler@silveiro.com.br.