Catástrofes Naturais – Enchentes no Rio Grande do Sul – Seguros – Regras Regulatórias da Superintendência de Seguros Privados (“Susep”) – Cobertura Mínima.
Sob a perspectiva do Direito Securitário e Regulatório, este documento visa a responder a seguinte questão: “A cobertura básica de seguro patrimonial residencial, patrimonial empresarial e de veículos, conforme estabelecido pelas normativas da SUSEP, inclui proteção contra danos causados por água, alagamento, inundação e chuvas intensas?”
QUADRO RESUMO
- Condições Contratuais dos Seguros: Coberturas e exclusões variam por seguradora e produto; não há pacote mínimo obrigatório para todos os seguros, exceto o habitacional.
- Seguro Habitacional (obrigatório em financiamento imobiliário): Cobertura básica mínima inclui incêndio, queda de raio, explosão, vendaval, desmoronamento, destelhamento, inundação/alagamento, com indenização para reposição do imóvel ao estado anterior ao sinistro. Além disso, cobre os riscos de morte e invalidez permanente do segurado.
- Seguro Automóvel: Em muitos casos, é contratado o seguro amplo, que contempla coberturas para enchentes. No entanto, pode-se optar por um seguro mais simples, que não inclui essa cobertura. É essencial analisar cada contrato individualmente para entender as coberturas específicas.
- Seguros Empresarial, Condomínio e Residencial: Fazem parte do chamado grupo compreensivo (Circular Susep nº 535/2016). No seguro residencial, a cobertura comum é contra incêndio, queda de raios e explosão, com opções adicionais para vários danos. No seguro condomínio, nos termos do Decreto-Lei nº 73/66 e do Código Civil, a cobertura básica simples inclui incêndio, queda de raio e explosão, e a ampla cobre qualquer dano físico exceto os excluídos no contrato. No seguro empresarial, a cobertura é para perdas e danos de acordo com os riscos cobertos, e é destinado a atividades comerciais, industriais, de serviços ou imóveis não residenciais.
- Legislação e Normas: Em consonância com a Lei de Liberdade Econômica (n. 13.874/2019), SUSEP e CNSP não obrigam inclusão de alagamentos nos seguros não habitacionais.
- Procedimentos Recomendados: Abrir sinistro junto à seguradora para obter posicionamento formal, além de buscar assessoria jurídica especializada para identificar se a apólice inclui ou não determinada cobertura.
- O Rio Grande do Sul enfrenta a pior catástrofe natural da história do Brasil. Embora seus efeitos ainda estejam em curso, estão em discussão projetos e medidas para a reconstrução dos municípios afetados. Nesse contexto, seguradoras serão altamente demandadas para cobrir perdas financeiras relacionadas aos negócios, imóveis e veículos segurados.[1]
- Como é sabido, as condições contratuais dos seguros detalham as coberturas incluídas, especificando os riscos cobertos e excluídos.[2] Porém, surge a dúvida sobre as regras regulatórias do pacote mínimo obrigatório que as seguradoras devem oferecer.
- Diferente do que ocorre com o seguro habitacional, conforme se verá abaixo, em consonância com a Lei de Liberdade Econômica (n. 13.874/2019), a SUSEP esclarece que não existe uma condição contratual padrão ou até mesmo coberturas mínimas que uma determinada seguradora precisa oferecer, podendo as condições e coberturas variar de acordo com cada seguradora e produto.[3]
- No que se refere ao seguro habitacional[4], a cobertura básica oferece, no mínimo, proteção em relação aos danos provenientes de incêndio, queda de raio, explosão, vendaval, desmoronamento total ou parcial, ameaça de desmoronamento, destelhamento, inundação ou alagamento, ainda que recorrente de chuva. Nesses casos, a indenização[5] corresponderá ao pagamento das parcelas de dívida do segurado, correspondente ao saldo devedor, que estão para vencer na data do sinistro e relativas a financiamento para aquisição, reforma ou construção de imóvel, ou a reposição de tal imóvel financiado, na ocorrência de sinistro coberto, conforme a cobertura contratada.
- Em relação ao seguro automóvel, as coberturas de casco podem abranger, de forma isolada ou combinada, diferentes riscos que veículo está sujeito, e ainda, mais uma vez, de acordo com o que estiver estabelecido nas condições contratuais. Em muitos casos, é contratado um seguro mais amplo, que contempla coberturas para enchentes. No entanto, nas modalidades mais simples, esse tipo de cobertura não está incluída.
- No que se refere aos seguros compreensivo empresarial, condomínio e residencial[6], de um modo geral, é essencial analisar cada caso individualmente, verificando nas condições gerais o que foi contratado e o que foi excluído.
- No compreensivo condomínio, destacamos que a cobertura, geralmente, abrange as áreas comuns do condomínio. Esse tipo de seguro oferece duas modalidades possíveis: (i) a cobertura simples, que oferece as coberturas de incêndio, quedas de raio dentro do terreno segurado e explosão de qualquer natureza; e (ii) a cobertura simples ampla, que oferece coberturas para quaisquer eventos que possam causar danos físicos ao imóvel segurado, exceto aqueles expressamente excluídos. Em ambas as modalidades de seguro condomínio, podem ser oferecidas coberturas adicionais conforme os riscos a que o condomínio está exposto, respeitando a legislação vigente.
- Portanto, ao contrário do seguro habitacional, que possui coberturas mínimas obrigatórias, para a maioria dos outros tipos de seguro isso não ocorre. Ou seja, para os demais seguros, os atos normativos da SUSEP e do CNSP não preveem expressamente a obrigação de incluir cobertura para alagamentos nos seguros empresariais, residenciais e de condomínio, sendo necessária observar as condições contratuais previstas caso a caso.[7]
- Por decorrência, como a cobertura para inundações não é uma proteção mínima obrigatória nos seguros, é de se esperar que o Judiciário seja acionado para interpretar os contratos de seguro que contenham disposições que gerem dúvidas aos consumidores, caso haja negativa de proteção.[8]
- No entanto, para eventual esclarecimento de dúvidas sobre coberturas, recomendamos que seja aberto sinistro junto às seguradoras, permitindo assim um posicionamento formal das sociedades seguradoras no caso específico, bem como buscar assessoria jurídica especializada para identificar se a apólice inclui ou não determinada cobertura.
Permanecemos à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários.
Rodrigo Mutti | rodrigo.mutti@silveiro.com.br
Ricardo Leal de Moraes | ricardo.moraes@silveiro.com.br
Celso Basílio | celso.basilio@silveiro.com.br
Gabriel Deberaldini | gabriel.deberaldini@silveiro.com.br
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[1] “Segundo a CNseg, o Sul tem a maior penetração de seguro residencial no país, de 38%, seguido por São Paulo, com 29%.”(https://www.fenacor.org.br/noticias/seguradoras-estao-assustadas-com-a-calamidade#:~:text=Segundo%20a%20CNseg%2C%20o%20Sul,São%20Paulo%2C%20com%2029%25).
[2] Ainda, além das condições contratuais, as coberturas que estão efetivamente contratadas e a definição de cada uma delas são previstas na apólice (i.e.: documento emitido pela sociedade seguradora por qualquer meio que se possa comprovar, físico ou por meios remotos, nos termos da regulamentação específica, formalizando a aceitação da cobertura solicitada pelo proponente, nos planos individuais, ou pelo estipulante, nos planos coletivos, conforme Resolução CNSP 348/17).
[3] No entanto, a Resolução do Conselho Nacional de Seguros Privados (“CNSP”) 382[3], dispõe sobre os princípios que devem ser observados nas práticas de conduta pelas sociedades seguradoras, sociedades de capitalização e entidades de previdência no relacionamento com seus clientes. Esses princípios incluem ética, responsabilidade, transparência e boa-fé, promovendo o tratamento adequado do cliente e fortalecendo a confiança no sistema de seguros privados. (https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/21953).
[4] O seguro habitacional tem por objetivo o pagamento das parcelas de dívida do segurado, correspondente ao saldo devedor, que estão para vencer na data do sinistro e relativas a financiamento para aquisição, reforma ou construção de imóvel, ou a reposição de tal imóvel financiado, na ocorrência de sinistro coberto, conforme a cobertura contratada. Também se enquadram no rol dos imóveis do seguro habitacional aqueles que correspondem às operações de consórcios, devendo ser consideradas, no que couber, as disposições constantes da Resolução CNSP nº 447, de 10 de outubro de 2022.
(https://www2.susep.gov.br/safe/scripts/bnweb/bnmapi.exe?router=upload/26564).
[5] Destacamos que eventual divergência ou questionamento em relação a valores de indenização, as normas da SUSEP estabelecem que, nas condições contratuais, deve existir uma cláusula estabelecendo os critérios objetivos utilizados na apuração dos benefícios, bem como se a apuração será realizada com base no valor do bem novo ou no valor atual do bem. Além disso, nas condições contratuais também deverá ser estabelecido um prazo máximo de liquidação de sinistros, que não deve ultrapassar 30 dias contados a partir da data de entrega dos documentos básicos definidos nas condições contratuais. Por fim, as despesas que incorrerem em função de salvamento comprovadamente efetuadas pelo segurado, durante ou após a ocorrência de sinistro, bem como os valores referentes aos danos patrimoniais causados pelo segurado ou por terceiros, na tentativa de mitigar o sinistro, devem ser cobertas pela seguradora no limite máximo da indenização estabelecida na apólice.
[6] O seguro compreensivo residencial é destinado a residências individuais, casas e apartamentos, habituais ou de veraneio. O compreensivo condomínio, é destinado a edificação ou a um conjunto de edificações, abrangendo todas as unidades autônomas e partes comuns destinadas a fins residenciais ou não-residenciais.
[7] No site da SUSEP (através da ferramenta Meu Seguro), estão disponíveis as condições gerais de todos os produtos protocolados no Regulador: https://www2.susep.gov.br/safe/menumercado/REP2/Produto.aspx/Consultar. Há também outra ferramenta disponível pela SUSEP, através do GOV.BR, que permite que cidadãos brasileiros pesquisem seguros cadastrados em seu nome: https://www.gov.br/pt-br/servicos/sistema-de-consulta-de-seguros.
[8] APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO DE FLORESTA ATINGIDA PELO FENÔMENO NATURAL DENOMINADO “CATARINA”. NEGATIVA DE PAGAMENTO COM BASE EM ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE “CICLONE” NÃO ELENCADO COMO CAUSA EXCLUDENTE DA COBERTURA. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM OS CONTRATOS EM GERAL. BOA- FÉ E PRO-BIDADE. ARTIGO 422 DO CC/02. RECURSO PROVIDO. DENUNCIAÇÃO DO IRB PROCEDENTE. (Apelação Cível. TJRS. 70034049460).
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