Uma mesma conduta é capaz de caracterizar ilícito criminal e cível, devendo as pretensões punitivas e reparatórias serem buscadas de forma independente, circunstância decorrente do entendimento consolidado nos Tribunais quanto à independência das instâncias. No entanto, há a possibilidade de decisões definitivas proferidas no processo criminal produzirem reflexos na esfera cível.
As decisões criminais condenatórias transitadas em julgado, além de produzirem seu efeito principal, qual seja, o reconhecimento da prática de um delito e a imposição da respectiva pena, possuem como efeito secundário a reparação do dano causado pelo crime. Por esse motivo, podem constituir título executivo judicial no âmbito cível.
Isso porque no âmbito criminal, ao proferir sentença condenatória, o juiz fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pela vítima. Tal decisão passa a ter caráter de título executivo, o qual poderá ser líquido, parcialmente líquido ou, ainda, ilíquido. Na primeira hipótese, estando de acordo com o valor estipulado, deverá ser proposta de imediato a execução do título perante o juízo cível, dispensando-se, para tanto, processo de conhecimento. Em contrapartida, havendo interesse em comprovar maior extensão do dano fixado, deverá ser intentada ação de conhecimento no âmbito cível. Em se tratando de parcial liquidez ou de iliquidez, necessária será a liquidação da sentença para estipulação do dano.
Importa destacar a inviabilidade de rediscussão na seara cível acerca da existência do fato ou de sua autoria quando tais questões tiverem sido objeto da decisão condenatória criminal.
Embora a esfera cível possua vinculação com a sentença criminal condenatória, é possível que a vítima de um crime ajuíze ação para ser ressarcida do dano oriundo da esfera criminal, através da denominada ação civil ex delicto. Referida ação pode ser movida seja em desfavor do autor do crime, seja contra o responsável civil, isto é, contra aquele que possui a obrigação de reparar o dano. Nesse sentido, estando em trâmite simultaneamente ação cível e penal, pode o juízo cível suspender a ação cível durante a tramitação do processo criminal.
A decisão criminal absolutória também produz reflexos no âmbito cível, ainda que com maiores limitações. A absolvição no processo criminal não necessariamente gerará imposição de ausência de responsabilidade na seara cível. Nesse sentido, a absolvição por insuficiência probatória não impede o processamento de ação cível ex delicto pois não versa sobre autoria ou materialidade do delito.
Da mesma forma, não fazem coisa julgada para o juízo cível sentenças absolutórias que reconhecem: (a) não haver prova da existência do fato, haja vista que o fato pode não ter existido na esfera criminal, mas existido na esfera cível; (b) que o fato imputado não constitui infração penal, na medida em que pode ser um ilícito civil e (c) não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal. Assim também são os efeitos das decisões que determinam a extinção da punibilidade do agente ou que arquivam o inquérito policial.
Há, contudo, necessária vinculação entre os juízos cível e criminal quando este último reconhecer a inexistência do fato imputado ou a negativa de autoria. Assim, a superveniência de decisão nesse sentido impede o ajuizamento de ação cível ex delicto.
Ainda tratando de exceções à regra geral, destaca-se que faz coisa julgada em âmbito cível a sentença absolutória criminal que reconhecer alguma excludente de ilicitude, quais sejam: legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito.
O breve exposto demonstra os reflexos extrapenais das decisões criminais condenatórias e absolutórias definitivas para com o juízo cível, o que evidencia a relevância do acompanhamento conjunto de ações para definição de estratégias.
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